domingo, 6 de janeiro de 2008

3 EFES

Carlos Gerbase é um dos maiores nomes do cinema gaúcho. Ponto. Isso poucos discutem. Mas sua importância está muito mais relacionada ao pioneirismo e à produtividade do que exatamente pela qualidade de seus trabalhos. Tem relevância pelos primeiros longas, lá no início dos anos 80, como INVERNO (1983) e VERDES ANOS (1984), por ter sido um dos fundadores da Casa de Cinema de Porto Alegre, produtora que completou 20 anos de atividades no ano passado, e por ter realizado algumas das mais destacadas obras no Rio Grande do Sul após a retomada do cinema nacional lá pela metade dos anos 90, como TOLERÂNCIA (2000) e SAL DE PRATA (2005). Mas estes são bons filmes? Esta questão provoca dúvidas e debates. E seu novo trabalho, o independente 3 EFES, segue o mesmo caminho.

Filmado em apenas 20 dias, da forma mais rápida e barata possível (especula-se que tenha custado menos de 100 mil reais), em vídeo digital e com equipe e elenco totalmente gaúcho - muitos alunos do próprio diretor no curso de graduação em Cinema da PUC-RS - 3 EFES é para Gerbase o que HOUVE UMA VEZ DOIS VERÕES (2002) foi para seu colega Jorge Furtado: uma obra pequena, porém não menor, que de forma descompromissada e discreta consegue explorar melhor suas possibilidades, revelando um domínio da linguagem cinematográfica mais apurada e centrando-se no que realmente importa: no roteiro e no desempenho dos atores e técnicos.

Se TOLERÂNCIA pretendia marcar o cinema policial brasileiro, partindo da nova composição familiar moderna, SAL DE PRATA era ainda mais filosófico, tentando ousar a partir de um ponto de vista interno da sétima arte, discutindo a estrutura da imagem na ficção audiovisual, com elementos de morte e romance (para ficarmos somente entre os dois filmes anteriores do cineasta). Já 3 EFES tem como argumento uma teoria mais divertida do que pretensiosa: a de que todo ser humano é regido por três instintos básicos, palavras essas iniciadas com a letra "F": fome, foda e fasma (que, apesar de não ter no meu dicionário, teria origem no grego - ou seria latim? - e significaria "representação, vaidade, máscaras sociais que assumimos diante as mais diversas situações"). Assim, ele nos coloca diante uma moça que sozinha precisa sustentar o irmão mais novo e o pai desempregado. Cansada do trabalho, decide aceitar o convite de uma amiga para trabalhar como prostituta. Ao mesmo tempo, descobre que há um histórico familiar no assunto - sua tia, hoje casada, fazia programas quando mais nova. Esta, por sua vez, se sente atraída por um papeleiro, ao mesmo tempo em que o marido dela irá fazer uso do seu poder sexual para tentar manter o emprego.

Em resumo, o que temos é uma comédia de erros clássica, com desencontros, confusões e trapalhadas. Porém, ao lado do humor leve, há também uma certa dose de crítica social, levantando pontos de vistas pertinentes ao nosso universo contemporâneo: o que vale mais, barriga cheia ou valores éticos tradicionais? O que compõe uma verdadeira família? Até que ponto estamos dispostos a "interpretar" para atender necessidades básicas? Gerbase, por mais que tente confrontar e inovar, é, na verdade, até um pouco conservador em suas preocupações.

3 EFES chamou atenção também por ter sido lançado de forma simultânea em quatro mídias distintas: cinema (em cópias digitais), em dvd (para locação e venda), na tv (no Canal Brasil e na TVCOM-RS) e pela internet (para download no site oficial). Ou seja, só não viu quem realmente não quis. A experiência parece ter sido bem sucedida, já que só os contratos de venda para tv, dvd e internet garantiram os custos da produção, sem precisar esperar pelos resultados das bilheterias. Mesmo assim, não é um caminho definitivo a ser seguido, e que parece poder se aplicar somente a alguns casos mais específicos, como este. Não que vá gerar tendência, mas ainda assim é um exemplo a ser estudado. E se artisticamente o filme não chega a se destacar, ao menos consegue se posicionar de modo bem mais confortável dentro do currículo do seu realizador. O que, convenhamos, também não quer dizer tanta coisa assim.

3 Efes, Brasil, 2007
(nota 6)



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